Maria Eugania Mendrone -26 anos - Cursa Radio e TV
A
Princesa Mononoke conta a história do amor impossível de
San e Ashitaka em sua batalha pela preservação da natureza contra as ações
destrutivas do ser humano.
O filme começa com Ashitaka, um jovem príncipe da
vila de Emishi, que se vê em luta contra Nago, o deus-javali, cujo corpo fora possuído
pelo deus da Maldição, um demônio, que tinha a intenção de destruir a vila.
Ashitaka consegue matar o oponente, mas sofre uma maldição: seu braço direito ganha
força sobre-humana, ativada pelo sentimento de ódio. Isso pode transformá-lo
num demônio, que aos poucos vai consumir sua vida.
Aconselhado pela sábia e pelos anciões da vila, Ashitaka
parte em busca da cura de sua maldição. A viagem o leva à Cidade de Ferro,
governada por Lady Eboshi, uma mulher que explora intensamente os recursos
naturais, detendo o monopólio do minério de ferro. Instigada pelo monge Jiko,
enviado do imperador, Lady Eboshi tenta matar Notívago, o Espírito da Floresta,
cortando-lhe a cabeça. (O imperador acredita que quem beber o sangue desse
espírito terá vida eterna.) Com a morte de Notívago, Lady Eboshi pretende a
conquista total da floresta sagrada.
Logo após chegar à cidade, Ashitaka conhece San, a
Princesa Mononoke, que, quando criança, fora adotada pela deusa Moro, uma loba
gigante. Ashitaka e San apaixonam-se e juntos querem defender e preservar a
natureza, proteger os animais e os espíritos que lá habitam.
A
Princesa Mononoke é um filme que trata da eterna disputa
entre o bem e o mal, no caso, a ação do ser humano de explorar os recursos
naturais da floresta de forma gananciosa, prejudicando o ambiente. Mas não há
bons ou maus, vencedores ou perdedores nessa história, apenas a luta pela
sobrevivência.
Apresentam-se três pontos de vista diferentes: o primeiro
deles é o de Ashitaka, que quer fazer o bem, não permitindo que a natureza seja
devastada, mas sente ódio pela destruição que o ser humano provoca no ambiente,
por lucro e poder. Ocorre que, para evitar que sua maldição se alastre pelo
corpo transformando-o num demônio, ele não pode demonstrar esse ódio, ou seja,
ele é um herói em constante conflito.
O segundo ponto de vista é o de Lady Eboshi, que, apesar
de ser ambiciosa ao querer conquistar a floresta para usufruir de seus
recursos, revela um lado afetuoso: cuida de ex-prostitutas, carabineiros e
leprosos, dando-lhes
abrigo e trabalho[P1] ,
e estes passam a idolatrá-la como deusa. Ainda assim tenta matar o Espírito da Floresta,
como um favor ao imperador (e, claro, em benefício próprio). Ela não é uma vilã,
no sentido de maldade, mas uma oponente da natureza, pois somente os animais a
veem como inimiga.
O terceiro ponto de vista é o de San, que não se
considera humana e escolhe lutar ao lado dos animais que a criaram desde
pequena, não perdoando a atitude dos seres humanos. Caracteriza-se então a personagem
da heroína forte e valente.
O conflito entre homens e natureza é frequente no
filme, mas também se evidencia a tentativa de proteção dos espíritos da
floresta, ou seja, a reação da energia vital do planeta ante a destruição
causada pela ação humana. A história se passa na era feudal japonesa, cuja cultura
se fundamenta principalmente na mitologia e em lendas dos folclores regionais, nas
quais ocorre obrigatoriamente a presença de Deus em formas animalescas, demônios,
espíritos e entidades fantasmagóricas.
O que mais desperta a atenção é a simbologia:
- os demônios
são o resultado da interferência destrutiva do homem na natureza, o sentimento
de ódio transmitido por eles é uma metáfora para um mal, uma doença que se instala
no corpo do hospedeiro corrompendo-o, consumindo-o aos poucos e, por fim, matando-o.
- os pequenos kodamas são espíritos puros, que, junto
como os deuses animais, tentam proteger e preservar a floresta.
- os macacos
de pelo negro e olhos vermelhos
reivindicam direitos e protestam contra a destruição e a morte, mas nada fazem
para melhorar a situação, não buscam amenizar os conflitos, mas promovem a
discórdia, pois acreditam que todos são intrusos em seu território e ainda culpam
San por não pertencer ao mundo deles. Os macacos representam uma metáfora da
atitude comodista dos seres humanos.
- Notívago,
o Grande Espírito, é um Deus que se transforma todo dia e toda noite – ele dá a
vida e também a tira. O espírito não toma partido na disputa, apenas protege o
equilíbrio entre a vida e a morte, mas o que se aponta claramente é que o espírito
pode ser corrompido pela ação do homem. Ao ter cortada a cabeça, Notívago se transforma
em um Shinigami (Deus da Morte), que,
na busca da cabeça decepada, infecta a floresta com o mal, matando-a. (Podemos correlacionar
essa situação com o exemplo do princípio de Gaia, que diz que o planeta Terra é
um ser vivo, capaz de se sustentar, mas a interferência direta e constante
resulta em severas mudanças em seu ambiente.)
A determinação de San e Ashitaka de devolver a
cabeça a Notívago faz com que este reviva; assim, aos poucos a floresta se
purifica e a natureza se restaura, mostrando que a vida sempre encontra uma
forma de se renovar, na presença de um ato real de bondade e amor, sem se levar
por cobiça e ganância, mas escolhendo fazer o bem.
Em meio à luta para recuperar a cabeça do Grande Espírito,
Ashitaka salva a vida de San. Esse ato de amor, porém, tem um preço: ele carregará
para sempre um resquício da maldição em seu corpo. Os dois seguem caminhos
diferentes, pois, apesar de se amarem, cada qual tem um destino a cumprir: San deve
defender a floresta e Ashitaka deve retornar a sua aldeia para ajudar na
reconstrução.
O filme revela excelente fotografia, com traços
sutilmente marcados, mas com cores fortes; é perceptível o uso de tonalidades quentes
e cores vívidas em cenas de ambientes claros, e foscas em cenas de ambientes
escuros. A música contextualiza os sentimentos e a circunstância de cada cena;
é possível perceber também que boa parte do filme se concentra em apresentar paisagens
do Japão. Músicas e paisagens se fundem com harmonia, fazendo com que o
expectador possa imaginar-se em um ambiente sereno. Apesar de o filme contar
com muitas cenas de batalha, o teor de violência é moderado, em se tratando de
uma animação infantojuvenil.
Além de receber indicação para o Oscar de Melhor
Filme Estrangeiro, A Princesa Mononoke
é o primeiro filme de animação a ganhar o Prêmio da Academia do Japão como Melhor
Filme. No contexto narrativo da luta entre a natureza e humanidade a premiação
é plenamente justificável, pois o tema desperta o interesse de todos e deve ser
melhor discutido e abordado pelo público em geral.
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